Os sete monstros de Tau e Kerana

Nas profundezas da mitologia guarani, entre lendas de deuses criadores e terras sagradas, surge uma história sombria e fascinante: a origem dos sete monstros filhos de Tau e Kerana. Esses seres míticos, nascidos da união do espírito do mal e de uma jovem humana, personificam as forças da natureza, os temores ancestrais e os desafios que moldaram a existência dos povos guaranis.

“Das trevas e do desejo proibido, nasceram aqueles que habitam a fronteira entre o sonho e o pesadelo”, narravam os antigos pajés.

Quem são Tau e Kerana

Tau é o espírito do mal na mitologia guarani. Não é exatamente um demônio, mas representa a tentação, o desequilíbrio e as forças destrutivas do universo.

Kerana era uma jovem mortal, filha de Marangatú, um dos primeiros humanos criados por Tupã. Ela era descrita como de beleza incomparável, irradiando pureza e luz.

Tau, ao ver Kerana, foi tomado por um desejo irresistível. Disfarçado, seduziu-a e a raptou. Do sequestro e da união forçada entre o espírito do mal e a jovem humana nasceram os sete monstros.

Curiosidade: Em algumas versões, Kerana foi libertada após sete anos de cativeiro.

A maldição dos deuses

A criação desses filhos monstruosos foi vista como uma afronta à ordem sagrada. Como punição, os deuses decretaram que cada descendente teria forma monstruosa e viveria para sempre entre os humanos, espalhando medo e admiração.

Reflexão: Na cultura guarani, o mal não é destruído, mas integrado ao equilíbrio da vida.

Os sete monstros

Cada um dos filhos de Tau e Kerana representa aspectos da natureza e da existência humana. Vamos conhecê-los:

1. Teju Jagua

  • Forma: Um lagarto gigante com sete cabeças de cão.
  • Domínio: Guardião das cavernas e tesouros subterrâneos.
  • Símbolo: A riqueza escondida e os perigos das profundezas.

Curiosidade: Era associado à sabedoria escondida, sendo temido e reverenciado.

2. Mbói Tu’

  • Forma: Uma serpente imensa com cabeça de papagaio.
  • Domínio: Senhor das águas, lagos e rios.
  • Símbolo: O poder oculto da natureza aquática.

Reflexão: Representa o mistério e o respeito que os guaranis tinham pelos rios.

3. Moñañá

  • Forma: Um monstro invisível, capaz de enlouquecer as pessoas.
  • Domínio: Guardião da solidão e da loucura.
  • Símbolo: Os perigos da mente e da alienação.

Curiosidade: Era temido pelos viajantes solitários.

4. Jasy Jatere

  • Forma: Um jovem loiro de olhos azuis, encantador.
  • Domínio: Protetor das sonecas das crianças e guardião da erva-mate.
  • Símbolo: O poder da sedução e dos sonhos.

Reflexão: Nem todo monstro é maligno; alguns guardam segredos de proteção.

5. Kurupi

  • Forma: Um anão de corpo forte e órgão genital exageradamente longo.
  • Domínio: Deus da sexualidade e da fertilidade.
  • Símbolo: A força instintiva da geração da vida.

Curiosidade: As aldeias invocavam Kurupi para garantir boas colheitas e nascimentos.

6. Ao Ao

  • Forma: Uma ovelha-cão monstruosa.
  • Domínio: Senhor dos campos e da perseguição.
  • Símbolo: O medo da morte e da destruição.

Reflexão: Era o terror dos caçadores e dos viajantes.

7. Luisón

  • Forma: Um ser semelhante a um lobo.
  • Domínio: Mestre da morte e da decomposição.
  • Símbolo: A inevitabilidade da morte.

Curiosidade: Luisón era associado às casas abandonadas e aos cemitérios.

Função simbólica dos monstros

Os sete monstros não eram vistos apenas como ameaças, mas como parte do equilíbrio natural. Eles ensinavam lições valiosas:

  • Respeitar a natureza e seus mistérios.
  • Aceitar que o bem e o mal coexistem.
  • Valorizar a coragem e a sabedoria.

Reflexão: A superação do medo conduz à sabedoria.

Comparativos com outras culturas

Lendas de monstros não são exclusivas dos guaranis:

  • Grécia antiga: Hércules enfrentou vários monstros em seus trabalhos.
  • Mitologia nórdica: Loki gerou criaturas como Fenrir e a Serpente de Midgard.
  • Mitologia japonesa: Os yokais são espíritos monstruosos ligados à natureza.

Esses paralelos mostram como o medo, a maravilha e o desafio são universais.

Os monstros na cultura popular

Hoje, os sete monstros ainda vivem na cultura popular do Paraguai, Brasil e Argentina:

  • Festivais e peças teatrais recontam suas lendas.
  • Músicas tradicionais celebram suas histórias.
  • Histórias infantis adaptam os monstros como personagens simpáticos.

Curiosidade: Em algumas cidades, existem estátuas representando cada um dos monstros.

Lições dos sete monstros

A lenda de Tau, Kerana e seus filhos nos ensina que:

  • A natureza tem forças incontroláveis.
  • Cada desafio tem uma lição escondida.
  • A coragem é essencial para enfrentar o desconhecido.
  • O medo pode ser transformado em respeito e sabedoria.

Citação guarani: “Aquele que respeita a floresta caminha sem medo.”

Os poderes e fraquezas de cada monstro

Cada um dos sete monstros possui habilidades únicas, mas também fraquezas que os humanos poderiam explorar:

  • Teju Jagua: Apesar de seu tamanho e força, era lento e vulnerável à luz intensa.
  • Mbói Tu’: Tinha controle sobre águas, mas era afastado por rituais e oferendas ao espírito dos rios.
  • Moñañá: Invisível e enlouquecedor, podia ser evitado através de proteções espirituais e do contato com a comunidade.
  • Jasy Jatere: Embora sedutor, era vulnerável a palavras sagradas e encantamentos.
  • Kurupi: Atraído pela fertilidade, podia ser distraído por oferendas de alimentos e danças.
  • Ao Ao: Voraz e incansável, era repelido através de truques que confundissem seu olfato.
  • Luisón: Mestre da morte, podia ser evitado através de rituais de purificação e rezas específicas.

Reflexão: Mesmo as forças mais temíveis podem ser enfrentadas com sabedoria e coragem.

A influência dos monstros na vida cotidiana dos guaranis

As crenças nos monstros influenciavam muitos aspectos da vida diária dos guaranis:

  • Horários de saída: Evitavam viajar ao entardecer, para não encontrar Jasy Jatere.
  • Proteção de crianças: Mães ensinavam os filhos a respeitar a natureza para evitar atraí-los.
  • Agricultura: Rituais eram realizados para apaziguar Kurupi e garantir boas colheitas.
  • Construção de casas: Locais considerados “assombrados” por Luisón eram evitados.

Essas práticas demonstram como a mitologia moldava o comportamento social, promovendo respeito e cautela diante da natureza.

Curiosidade: Até hoje, algumas comunidades evitam nadar em certos rios por medo de Mbói Tu’.

Conclusão

Os sete monstros de Tau e Kerana são mais do que criaturas assustadoras: são reflexos das forças indomáveis da natureza e da própria alma humana.

Em um mundo onde tendemos a querer controlar tudo, as lendas guaranis nos lembram que viver é também aceitar o mistério, o inesperado e o incompreensível.

Hoje, ao ouvir o rugido de um rio, o assobio do vento ou o sussurro das árvores, talvez possamos sentir a presença antiga dos filhos de Tau e Kerana, convidando-nos a recordar que somos parte de um universo muito maior e mais misterioso do que ousamos imaginar.

Redescobrir essas histórias é também redescobrir o respeito pela natureza, a coragem diante dos desafios e a aceitação de que nem todos os monstros são para ser derrotados: alguns existem para ensinar que o verdadeiro heroísmo está em viver em harmonia com o mundo, seus mistérios e suas forças ocultas.

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